31.5.07

Ver e ouvir

Juli Marchi Palma na área externa do Museu d'Orsay Paris
Foto Luiz Palma abril/2007

A cultura não pode organizar a esfera social sem signos, afirmam os semioticistas

O labirinto

Este é o labirinto de Creta. Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro. Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja rede de pedra se perderam tantas gerações. Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro, que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja rede de pedra se perderam tantas gerações como Maria Kodama e eu nos perdemos. Este é o labirinto de Creta cujo centro foi o Minotauro, que Dante imaginou como um touro com cabeça de homem e em cuja rede de pedra se perderam tantas gerações como Maria Kodama e eu nos perdemos naquela manhã e continuamos perdidos no tempo, esse outro labirinto.
Borges

HINO

Esta manhã há no ar a incrível fragrância das rosas do Paraíso.
Nas margens do Eufrates Adão descobre a frescura da água.
Uma chuva de ouro cai do céu; é o amor de Zeus.
Salta do mar um peixe e um homem de Arigento recordará ter sido esse peixe.
Na caverna cujo nome será Altamira uma mão sem cara traça a curva de um lombo de bisonte.
A lenta mão de Virgílio acaricia a seda que trouxeram do reino do Imperador Amarelo as caravanas e as naves.
O primeiro rouxinol canta na Hungria.
Jesus vê na moeda o perfil de César.
Pitágoras revela a seus gregos que a forma do tempo é a do círculo.
Numa ilha do Oceano os cães de prata perseguem os cervos de outro.
Numa bigorna forjam a espada que será fiel a Sigurd.
Whitman canta em Manhattan.
Homero nasce em sete cidades.
Uma donzela acaba de aprisionar o unicórnio branco.
Todo o passado volta como uma onda e essas antigas coisas recorrem porque a mulher te beijou.
Jorge Luís Borges

A tarde cai

O homem velho deixa vida e morte para trás
Cabeça a prumo, segue rumo e nunca, nunca mais
O grande espelho que é o mundo ousaria refletir os seus sinais
O homem velho é o rei dos animais
A solidão agora é sólida, uma pedra ao sol.
As linhas do destino nas mãos a mão apagou
Ele já tem a alma saturada de poesia, soul e rock'n'roll
As coisas migram e ele serve de farol

A carne, a arte arde, a tarde cai
No abismo das esquinas
A brisa leve traz o olor fugaz
Do sexo das meninas
Luz fria, seus cabelos têm tristeza de neon
Belezas, dores e alegrias passam sem um som
Eu vejo o homem velho rindo numa curva do caminho de Hebron
E a seu olhar tudo o que é cor muda de tom
Os filhos, filmes, livros, ditos como um vendaval
Espalham-no além da ilusão do seu ser pessoal
Mas ele dói e brilha único, indivíduo, maravilha sem igual
Já tem coragem de saber que é imortal
Caetano Veloso. Dedicado à memória de seu pai, a Mick Jagger e a Chico Buarque. No blog reproduzo em lembrança do meu pai e dedico aos meus irmãos e aos meus velhos amigos